SLAM: a poesia de resistência nas escolas
Muito além da poesia falada, os slams são sinônimo de resistência.
26/04/2024
Amanda Nascimento e Clara Zamboni
O Slam, termo cunhado pela onomatopeia, em inglês, que simula o som de palmas, é uma competição de poesia falada que se propõe a questionar pautas como o racismo, machismo, violência, problemas da periferia e pautas LBGTQIA+ por meio das poesias recitadas pelos slammers – como são chamados os participantes dos Slams.
Essas performances, as quais devem contar com poesias autorais a serem lidas (ou decoradas) em até 3 minutos, são avaliadas por um júri – os slammasters – responsável por dar notas de 0 a 10 para o slammer, assim, o competidor com a maior pontuação, vence. É importante pontuar que a utilização de fantasias, instrumentos e adereços é proibida, afinal de contas, é priorizada a qualidade da poesia e como ela é recitada, não elementos externos.
O evento, que se originou em bairros de classe média, rapidamente se espalhou pelas periferias, dominando os espaços públicos, como ruas, praças e estações de metrô, como é o caso do Slam da Guilhermina, que teve sua última edição dia 29/03, uma sexta-feira. Hoje, através da conexão entre o Slam e outros movimentos urbanos, como o Hip Hop, nota-se a celebração da cultura periférica e sua importância na resistência social e política daqueles que estão à margem, reclamando seu controle na narrativa de suas vidas.
Das ruas às escolas, das escolas às ruas
A expansão do Slam em direção ao espaço escolar, através de competições entre instituições, permite aos estudantes da periferia a compreensão de que a poesia está mais próxima do que eles imaginam. Em entrevista ao Central Periférica, Victor Emanuel dos Santos, de 19 anos, conhecido como Nuel, ganhador do Slam Interescolar em 2022, relatou que a participação na competição transformou sua perspectiva em relação a essa forma de arte.
“Eu acreditava que a poesia era apenas aquela produzida por autores de renome, que, em sua maioria, eram brancos e tiveram oportunidades privilegiadas de estudo, como Camões e Clarice Lispector, que eu gosto muito, porém, são distantes da minha realidade.” Além disso, o slammer ainda menciona o sentimento de pertencimento proporcionado pelo encontro com a poesia periférica: “Esse é o propósito do Slam, trazer a poesia para todos”.

Nuel recitando sua poesia [Imagem: Sérgio Silva/Arquivo Pessoal]
O sucesso do Slam
Joselicio Freitas dos Santos Júnior, que apresentou sua dissertação de mestrado com tema de “1,2,3…Slam da Guilhermina: a prática do Slam e a formação de fóruns poéticos periféricos”, quando questionado sobre a ascensão do Slam durante os anos de 2016 e 2017, Joselicio atribuiu esse “boom” ao cenário político nacional.
“Na minha tese de mestrado eu falo um pouco sobre isso, […] o que ajudou muito a espalhar essa modalidade foi justamente a internet, então, alguns vídeos, principalmente do Slam da resistência, que acontece na praça Roosevelt, começaram a filmar os poemas, que viralizaram muito no Facebook e no YouTube.”
Joselicio ainda acrescenta que os vídeos dialogavam com as mobilizações políticas que aconteciam no momento, como é o caso da viralização do poema “Não queria ser feminista”, de Tawane Theodoro. Nesse momento, debates sobre o aborto prevaleciam na Câmara e discussões sobre a composição exclusivamente masculina dos Ministérios ganharam destaque, fazendo com que a poesia de Tawane se conectasse com os acontecimentos do período.
“Assim, existiram outros vídeos como esse, os quais falavam de questões sociais, raciais, de gênero, então, a partir dessa viralização, aumentou a repercussão do Slam e ocupação de espaços por parte de pessoas jovens que utilizaram dessas discussões para fazerem suas poesias.”

Joselicio Freitas dos Santos Junior [Imagem: Joselicio Junior/Arquivo Pessoal]
Os ecos do Slam na educação e na cidadania
Além disso, os Slams interescolares oferecem um espaço para que os estudantes expressem livremente suas ideias, em contraponto às tendências silenciadoras do sistema educacional tradicional. “Sou um fã da educação e de Paulo Freire, sempre tento mencioná-lo em minhas produções. Acredito que os poetas sejam educadores, porém em circunstâncias diferentes das dos professores “, declara Nuel, que propôs a adesão ao Slam na escola em que estudava.
A competição ofereceu oportunidades aos alunos, que se sentiam excluídos e violentados, de denunciarem as discriminações sofridas e sofrimentos vivenciados através da arte. “Pudemos ver alunos tímidos e retraídos destacando-se no palco com produções incríveis e potentes. Sentíamos que a poesia estava gerando efeitos positivos na vida das pessoas.”
O slammer também destaca que as violências e angústias expostas pelas poesias dos estudantes permitem que os professores e coordenadores tenham um olhar mais atento às dificuldades vividas pelos seus alunos e pensem em contribuições coletivas.

Poesia de Victor Emanuel dos Santos, o “Nuel”