Batti Fácil é campeão da Copa da Paz em final inédita no Morumbi

Final da competição que nasceu em Paraisópolis chega ao maior estádio de São Paulo e consagra Batti Fácil o campeão da edição com gols de Patrick Fabiano

Por Ana Carolina Santos, Maria Luiza Ribeiro Teixeira e Regina Lemmi

Em arquibancada compartilhada, torcedores dos times finalistas passaram por fortes emoções na tarde deste sábado, 30 de novembro [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]
Em arquibancada compartilhada, torcedores dos times finalistas passaram por fortes emoções na tarde deste sábado, 30 de novembro [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]

O Estádio do Morumbi sediou a final da Copa da Paz, disputada pelos times MEC da Cidade Tiradentes e Batti Fácil da Vila Nhocune. A partida foi realizada no dia sábado, dia 30 de novembro. Reunindo mais de 6 mil pessoas nas arquibancadas, o duelo acirrado se encerrou com três gols, um para o MEC e dois, feitos por “Salamaleiko do Habibi”, para o time vencedor. 

De olho no jogo

O jogo iniciou às 16h com o hino nacional ao som de piano. Os jogadores entraram em campo por um túnel do patrocinador Uniex, loja de uniformes personalizados. Nas camisetas, carregavam o símbolo de mais outro patrocinador: a Claro. 

O primeiro tempo foi marcado pela tática ofensiva do MEC da Cidade Tiradentes. Aos 18 minutos de jogo, o time já contava com 4 tentativas de finalização, enquanto Batti continuava zerado.

Os ataques surtiram efeito aos 26 minutos do primeiro tempo. Aproveitando uma falta a favor do time, Nunes, centroavante do MEC, fez o primeiro gol da partida e o único do primeiro tempo.

Torcedores do MEC comemoram o primeiro gol do jogo, feito pelo camisa 27 do time depois de cobrança de falta [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]
Torcedores do MEC comemoram o primeiro gol do jogo, feito pelo camisa 27 do time depois de cobrança de falta [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]

No intervalo do jogo, os torcedores do Batti tomaram fôlego. Seu Luiz, integrante da Velha Guarda da Várzea, acompanha a modalidade há 50 anos e, neste jogo, torcia pelo time da Vila Nhocune. Para ele, o MEC apresentou melhor desempenho no primeiro tempo, mas ainda acreditava na vitória do seu time: “o MEC realmente foi superior, mas acredito que conseguiremos virar. Dá tempo!”.

O segundo tempo do jogo teve como destaque a mudança de postura do Batti Fácil, que adotou estratégias mais ofensivas a fim de reverter o placar. Patrick Fabiano, conhecido como “Salamaleiko do Habibi”, comandava as investidas. 

Aos 14 minutos da segunda parte do jogo, o camisa 33 do MEC derrubou o adversário Josué na área. Um pênalti foi concedido ao time da Vila Nhocune. Patrick Fabiano bate o pênalti e converte o lance, igualando o placar.

Os ataques de Batti Fácil persistiram e, após sucessivos passes e laterais, Habibi converteu mais uma vez. O jogador finalizou um cruzamento com um gol de cabeça, cravando 2×1 para seu time.

A torcida do Batti Fácil passou por momentos de tensão no primeiro tempo de jogo [Imagem: Ana Santos/Central Periférica]
A torcida do Batti Fácil passou por momentos de tensão no primeiro tempo de jogo [Imagem: Ana Santos/Central Periférica]

O time do MEC tentou reverter o placar, mas o cansaço dos jogadores e a tensão de uma final atrapalharam. O domínio presente no primeiro tempo não reapareceu e o time da Cidade Tiradentes, mesmo com acréscimos, não se recuperou. Assim, o juiz apita e Batti Fácil leva a taça em virada épica no campo histórico do São Paulo. 

Torcedores do MEC tensos com a aproximação do fim do jogo com o time em desvantagem [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]
Torcedores do MEC tensos com a aproximação do fim do jogo com o time em desvantagem [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]

O resultado para além do campo

O resultado da partida emocionou a parcela laranja da arquibancada. “Foi um grande jogo, que mostrou a força do Batti Fácil como time e como torcida”, comenta Rodrigo Luiz Silva, cujo filho Gabriel joga na categoria de base do time. 

Patrícia Jéssica, que é Batti há 12 anos, disse que quase morreu do coração no primeiro tempo, mas que tudo valeu a pena. Ela vê a vitória como resultado da luta de toda uma comunidade: “a gente está lutando até hoje para termos nossa vitória, nosso troféu. Hoje, nós conseguimos e somos campeões. Muito feliz, sem palavras”.

Sua mãe, Dorilene da Silva, ajudou a fundar o time e continua ainda hoje na diretoria. Emocionada, se diz orgulhosa da conquista e ressalta que “Batti Fácil é família. É tudo, tudo!”. O amor pelo time é tamanho que Dorilene prometeu que pararia de fumar caso o time fosse campeão. Logo após a partida, quando perguntada se iria, de fato, parar, ela respondeu: “já parei!”.

Do outro lado da história, torcedores do MEC lamentaram o resultado. Em meio a discordâncias em relação às decisões da arbitragem, muito se falou sobre o impacto das dimensões do campo no desempenho dos atletas e erros de técnicos de substituição. 

Apesar disso, também reconheceram o mérito de ocupar o 2° lugar de uma competição tão ampla. Matheus, torcedor do time há muito tempo, conclui: “É triste… Era o sonho de toda uma comunidade ser campeão aqui e no Allianz. Infelizmente não deu. O futebol é isso. Agora é bola pra frente o amor pelo MEC continua. O segundo lugar também tem que ser valorizado”

Uma edição especial: o futebol de várzea para além da periferia

O campeonato de 2024 iniciou no dia 9 de agosto com 40 times inscritos. A novidade deste ano foi justamente o palco da final, que era, até então, inédito. “Hoje estou realizando um sonho meu, sonho do meu pai e da minha família. Ele foi o primeiro que me trouxe nesse estádio.“ diz o jogador Gabriel Mendes do MEC. 

“A várzea está chegando e mostrando que também tem condições”, comenta Claudinei França, torcedor do Batti Fácil. Ele também ressalta a importância dos jogos para os torcedores, que se reúnem cedo e pintam partes do corpo em apoio ao time.

Segundo Bruno Melo, organizador da Copa, 6.253 torcedores estiveram presentes nas arquibancadas tricolores. Com tamanha expressividade, a Copa alcançou grandes apoios. Neste ano foi patrocinada pela F12.bet, um dos maiores sites de jogos de cassino online.

Cartaz da Copa da Paz e de seu patrocinador na entrada da arquibancada do Morumbis [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]
Cartaz da Copa da Paz e de seu patrocinador na entrada da arquibancada do Morumbis [Imagem: Maria Luiza Ribeiro Teixeira/Central Periférica]

Além do orgulho pelo sucesso da Copa, outro aspecto levantado pelos torcedores relacionado à mudança de ambiente é a acessibilidade. Além de espacialmente distante, os preços dos alimentos e bebidas ofertados no Estádio também foram criticados. 

Seu Luiz, da Velha Guarda, sintetiza: “um copo de água por oito reais é absurdo. Lá fora a garrafinha é quatro. Na nossa região é tudo mais acessível. Aqui eles abusam porque você tá num ambiente fechado, não pode sair lá pra fora e voltar; Então eles aproveitam e colocam o preço que eles querem”.

Uma iniciativa de longa data

A Copa da Paz, considerada a copa “mais charmosa da várzea”, surgiu em 2008 com o objetivo de unir, através do futebol amador, as periferias de Paraisópolis e região, marcadas pela violência e distanciamento. 

Bruno Melo, um dos idealizadores do projeto, ressalta o impacto positivo da competição nesta questão: “antigamente, alguém de uma quebrada não ia em outra. A Copa da Paz abriu a porta para o pessoal se conhecer e ver que, através do esporte e do futebol, a amizade prevalece”.

Na sua 16° edição, a Copa conta com um time de 15 organizadores voluntários: “a gente faz por amor mesmo, todo mundo voluntário”.  Dentre os participantes, está Francisco Luiz da Silva, conhecido como Chiquinho. Ele, que é pai de Bruno, atua há muitos anos pelo futebol na comunidade.

Uma das principais conquistas da equipe, que nunca obteve apoio governamental, foi a reforma do espaço que sedia as partidas. A Arena Palmeirinha, construída na década de 1980 com ajuda de seu Chiquinho, ganhou grama sintética na 4ª edição do campeonato. A final disputada no Morumbi é mais um capítulo dessa história. 

Ao  longo destes anos, o evento esportivo agita a comunidade de Paraisópolis e as demais regiões. Enquanto atrai os amantes de futebol, ele também contribui com os comerciantes locais, que veem o movimento aumentar no período de competição, sendo um exemplo do poder mobilizador do esporte.