Ascensão de serviços de streaming acentua exclusão no mundo do futebol
As transmissões pagas de jogos de futebol são um empecilho para a democratização, obrigando os torcedores a recorrerem a meios alternativos
Por Ana Julia Oliveira, Isabel Sampaio, João Pedro Teles e Raí Carvalhal

No domingo, 30 de março, na Zona Leste de São Paulo, torcedores foram vistos reunidos em torno da televisão de um bar para assistir a um jogo de futebol. A cena, mais comum do que parece, se deve aos altos valores cobrados pelos serviços de streaming, que começam a tomar conta do que antes era exibido em rede aberta.
Com a falta de acesso às plataformas digitais, o público busca outras formas de acompanhar os jogos. Uma das soluções mais comuns é se deslocar até algum estabelecimento, como bares de rua. Em entrevista ao Central Periférica, comerciantes da Zona Leste e Norte afirmam aumento de clientes nos horários dos jogos.
Ao conversar com alguns dos telespectadores, boa parte afirmou não ter como assistir aos jogos em casa. Por outro lado, alguns dos entrevistados afirmam que, de certa forma, a necessidade de sair de casa torna-se um novo momento de socialização e de integração.
No entanto, quando perguntado aos donos dos estabelecimentos quais streamings eles assinam, e se o aumento da clientela compensa o investimento, a resposta colocou um novo elemento em pauta: a pirataria. A maioria afirmou apelar a formas ilícitas de acesso às partidas – como o famoso “gatonet”, o que acaba sendo uma saída para a ausência de democratização do acesso ao esporte.
Em entrevista ao Central Periférica, a apresentadora do Meu Timão, jornalista Beatriz Maineti, afirma que as transformações nos direitos de transmissão do futebol acontecem há muitos anos: “O processo de transição entre a televisão aberta e os streamings na transmissão de jogos de futebol é algo muito antigo, desde a criação do pay-per-view”.
A jornalista traz o exemplo do Premiere, do Grupo Globo, criado em 1997 já com direito de transmitir exclusivamente alguns jogos do Campeonato Brasileiro daquele ano.
Aliada à exclusividade nas transmissões, a ligação do público com o futebol faz com que plataformas usem o fanatismo da torcida como meio para obtenção de lucro. “O torcedor fanático e apaixonado vai atrás do seu time aonde quer que ele vá”, diz Maineti.

Na tentativa de acompanhar a ascensão dos meios digitais, a alternativa das transmissões em streamings foi uma estratégia certeira para conquistar maiores patrocínios, aumentar a lucratividade e manter esse esquema onde o objetivo é apenas monetário.
“O torcedor, por si só, não é a prioridade da maior parte das empresas que transmitem os jogos de futebol no Brasil; o lucro é. O espectador é apenas um meio pelo qual os empresários devem conseguir este dinheiro”, explica a jornalista.
Apesar da força de vontade da torcida, é necessário questionar se assistir a um jogo de futebol deveria ser tão complicado. Contra todas as chances, o público resiste para manter a paixão viva, seja nos bares ou recorrendo a outros meios.