Estudantes criticam instalação de grades na moradia estudantil da USP

 

Tensão entre moradores e a Reitoria escala para agressões físicas no Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo (CRUSP)

 

Por Beatriz La Corte, Giulia Polizeli e Regina Lemmi

 

A porta de entrada do Bloco F do CRUSP uma semana depois do movimento de ocupação. [Foto: Regina Lemmi]
A porta de entrada do Bloco F do CRUSP uma semana depois do movimento de ocupação. [Foto: Regina Lemmi/Central Periférica]

 

A Reitoria da Universidade de São Paulo (USP) tentou instalar grades no Conjunto Residencial Universitário (CRUSP), apesar da discordância da Associação de Moradores do Crusp (Amorcrusp). A ação ocorreu no dia 14 de agosto e foi impedida por moradores e líderes estudantis. Em meio às negociações, alunos foram pisoteados e empurrados pelo embate entre a Guarda Universitária e os manifestantes. Após a decisão da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) de suspender a instalação dos portões, os estudantes fizeram vigília no andar térreo dos blocos F e G.

 

No bloco F, os cartazes reivindicam a negociação e transparência da PRIP. [Foto: Regina Lemmi]
No bloco F, os cartazes reivindicam a negociação e transparência da PRIP. [Foto: Regina Lemmi/Central Periférica]

 

Dia do ocorrido e antecedentes

 

Os estudantes presentes relataram ao Central Periférica que a instalação das grades foi uma ação imposta e não debatida com os moradores. De acordo com Matheus Freire, a PRIP já havia estabelecido a ideia dos portões, mas a execução do projeto não foi realizada de maneira transparente. Para ele, os residentes foram comunicados minimamente, mas não foram ouvidos. 

 

A PRIP convocou uma assembleia online, onde foi reportado a presença de menos de 1% dos moradores, para informar sobre a futura instalação das grades. Alguns dias depois, foi realizada uma votação por e-mail a favor da instalação, sem abertura para um espaço de debate entre os discentes e a gestão. Na votação porta a porta realizada, os votos contra a grade foram a maioria, de acordo com a associação.

 

“Os moradores se revoltaram muito contra aquela situação que eles estavam colocando, como se fosse uma humilhação constante. Um projeto que estaria servindo, mais uma vez, para excluir a gente da universidade.” 

Giovana Oliveira, Vice-Presidente da AmorCrusp.

 

No bloco F, os cartazes reivindicam a negociação e transparência da PRIP. [Foto: Regina Lemmi/Central Periférica]

 

CRUSP como resistência

 

O Conjunto Residencial da USP é um símbolo histórico de resistência estudantil. “O CRUSP era um refúgio para atividades culturais, como movimentos estudantis, distribuição de filmes proibidos, e as rádios livres (aquelas sem vinculação a partidos políticos, instituições religiosas ou grupo de interesse comercial), diante a censura oficializada pela ditadura”, disse Ivan Conterno, jornalista e criador do site crusp.net, que recorda memórias das habitações. Após o auxílio para estudantes de escola pública e a inserção de cotas, o CRUSP tornou-se um espaço para a expressão dos movimentos de periferia. 

 

Os relatos de ações repressivas da Guarda Universitária contra os inquilinos do CRUSP foram intensificados durante o ano de 2022, segundo Conterno. No dia da ação os residentes foram informados da instalação imediata uma hora antes via e-mail. 

 

Acerca do ocorrido, o jornalista aponta que “A Guarda Universitária nunca tinha se intrometido de forma ofensiva no CRUSP. Ao contrário, ao longo da história, ela sempre auxiliou os alunos. Ela tem um viés patrimonial de fazer a guarda dos prédios, do patrimônio da USP, não de revistar, nem reprimir, nem despejar, nem interferir em uma confusão entre estudantes e administração”.

 

Em entrevista ao Central Periférica, uma moradora não identificada do CRUSP, declara que vê as grades como uma solução provisória aos problemas de furto e assédio relatados dentro da moradia estudantil. Insegura dentro de sua própria casa, ela acredita que a identificação obrigatória no andar térreo iria impedir a entrada de pessoas não autorizadas e trazer maior tranquilidade aos moradores.

 

Para a maioria dos “cruspianos”, as grades não contemplam o que é necessário para fornecer segurança ao CRUSP. Giovana Oliveira, vice-presidenta da AmorCrusp, salienta:  “O que é segurança, senão você fornecer itens básicos de uma moradia?”. Ela ainda destaca que “para a PRIP, a segurança é uma segurança institucional, que vai de acordo com um sistema de repressão historicamente de uma classe social sobre outra. Eles não compreendem que essa segurança tem que ser debatida com os moradores”.

 

Os manifestantes fizeram vigília no saguão dos dois blocos por mais de uma semana. [Foto: Regina Lemmi]
Os manifestantes fizeram vigília no saguão dos dois blocos por mais de uma semana. [Foto: Regina Lemmi/Central Periférica]