CPI das Bets: o custo das apostas para a população periférica
Enquanto os parlamentares buscam entender os bastidores das apostas on-line, nas periferias o impacto já é uma realidade: lares desfeitos, dívidas e um vício que começa de maneira silenciosa
Por Gabriella Oliveira, Isabella Megara, Marimel Feitosa, Pedro Silva e Rachel Mendes

A CPI das Bets encerrou seus trabalhos no Senado sem aprovar o relatório final da senadora Soraya Thronicke (Podemos), que identificava possíveis crimes envolvendo empresários e influenciadores ligados às apostas on-line.
O documento ressalta o rápido crescimento do mercado, entre R$ 89 e 129 bilhões movimentados em 2023, e a forte concentração de apostadores nas periferias, onde os jogos pesam ainda mais no orçamento financeiro e favorecem o endividamento.
A psicóloga clínica Natalia Polgrymas Gers, que atua especificamente com o Transtorno do Jogo (TJ), explica que as apostas trabalham diretamente sobre o sistema de recompensa do cérebro. A partir disso, é gerada uma sensação de prazer. “A expectativa de vencer e a sensação de ganho atuam nesse sistema, um dos fatores centrais do comportamento de quem joga”.
Mas a dimensão do problema vai além da química cerebral. Conforme aponta a especialista, o vício também envolve questões emocionais e aspectos da história de vida do jogador. Para muitos, apostar é uma forma de lidar com momentos de tristeza, estresse ou tédio. Essa relação torna o comportamento repetitivo e difícil de interromper.
Esse é o caso da Priscila Maria da Silva, atendente de fast food, que se viu presa nesse ciclo. “No começo eu jogava porque ganhava, mas depois virou um vício. Eu mudei de humor, fiquei cheia de dívidas, me estresso à toa. Não jogue, gente, isso é uma desgraça”.
Além disso, a dinâmica dos jogos de azar, como bets, bingos e caça-níqueis, alimenta a ilusão de que insistir trará uma vitória certa, mesmo que cada jogada seja independente da anterior. “Uma crença comum é que, se jogar por tempo suficiente, é possível ganhar, como se o resultado esperado viesse caso o jogador apostasse continuamente. Dessa forma, a pessoa insiste em buscar a recompensa”, afirma a psicóloga.
Fernanda Furtado, moradora do Jardim Presidente Dutra, em Guarulhos, relata que sua mãe apostava todos os dias, motivada pela dificuldade financeira. “Ela achou que seria uma saída, mas acabava tirando do que precisava para jogar”, comenta.
Tratamento
Se você ou alguém próximo está enfrentando problemas com jogos de aposta, saiba que não está sozinho. Existe ajuda e é direito de todos acessá-la.
Embora ainda sejam poucos os serviços no Brasil, algumas cidades oferecem grupos como os Jogadores Anônimos (JA).
Em São Paulo, o PRO-AMJO, ligado ao Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, oferece atendimento gratuito e especializado para quem sofre com o Transtorno do Jogo, com terapias individuais, em grupo e familiares, além de atendimento psiquiátrico e atividades físicas.