Universidades públicas: a luta para permanecer
Alunos em situação de vulnerabilidade econômica relatam como é a situação de quem depende de programas de permanência
26/04/2024
Daniela Gonçalves, Davi Alves e Maria Negrão

Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo [Imagem: Davi Alves/Central Periférica]
Programas de permanência são responsáveis por dar suporte aos estudantes em situação de vulnerabilidade social para que consigam realizar plenamente seus estudos. No entanto, apesar da implementação dessas ações, universitários denunciam que, mesmo sendo contemplados com os benefícios, enfrentam dificuldades em conciliar seus estudos com a sobrevivência. Com isso, a continuidade nos cursos e a formação profissional dos alunos são comprometidas.
Para evitar a desistência nos estudos, os programas de permanência estudantil disponibilizam aos estudantes com dificuldades financeiras valores para ajudar nos gastos mensais, vagas em moradias estudantis e alimentação nos locais onde estudam. Em entrevista ao portal Central Periférica, estudantes de graduação nas universidades públicas do estado de São Paulo contaram suas realidades enquanto pessoas que dependem desses auxílios para continuar com seus estudos.
Restaurantes universitários
Os restaurantes universitários são outra medida para a permanência estudantil, por meio da isenção da taxa das refeições aos alunos beneficiados. Para os demais alunos, as taxas na USP são de R$2,00; na Unesp, R$2,50; e na Unicamp de R$3,00. A Unesp, no entanto, não oferece o café da manhã em seus restaurantes, o que ocorre na USP e Unicamp.
Os entrevistados ressaltam que um dos grandes problemas envolvendo a alimentação é a falta de refeições aos finais de semana. A Unicamp começou a oferecer almoço e jantar aos sábados e domingos no início de abril, como resultado de reivindicações da greve estudantil feita no ano passado. A USP não oferece refeições aos domingos. Já na Unesp, os alunos não conseguem os serviços de alimentação aos finais de semana.
“Tem gente que pega do bandejão durante a semana e faz marmita escondido, porque na teoria não pode”, diz Welle Souza, estudante do curso de química na Unicamp, sobre a ausência de refeições aos finais de semana.
Auxílios e moradias
Segundo a Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) da Universidade de São Paulo, em 2024 serão oferecidos 6.505 auxílios permanência – sendo 6.115 auxílios integrais (R$ 800,00) e 390 parciais (R$300,00 e vaga na moradia estudantil). Porém, mesmo com mais de um mês após o início do ano letivo na USP, nem todos os alunos que precisam do auxílio foram contemplados com o benefício e ainda estão sem previsão para recebê-lo.
Esse é o caso de Émerson Ryan, que morava em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, aprovado em 1° chamada no curso de música na USP e que se mudou mesmo sem nenhum auxílio: “Eu não tenho estrutura nenhuma. Quando eu vim para São Paulo, eu me inscrevi no PAPFE [Programa de Apoio à Permanência Estudantil] em janeiro. Infelizmente eu não tinha outros recursos. Eu estava contando somente com a USP. Eu tinha juntado dinheiro, mas acabei investindo em aulas de canto para conseguir dar conta do repertório que a USP estaria cobrando. E aí foi um desespero, tanto que quando eu cheguei em São Paulo no domingo, um dia antes das aulas começarem, estava desesperado porque não sabia aonde eu ia ficar”.
Émerson, até o momento de publicação desta matéria, não foi aprovado para a moradia definitiva e também não recebe nenhum valor de auxílio. No dia 5 de abril, data da divulgação da 2° chamada do PAPFE, o estudante de música recebeu um e-mail informando que ele teria sido selecionado para uma vaga na moradia definitiva. No entanto, quatro dias depois, ele foi informado pela assistente social por um e-mail de que, na realidade, ele não conseguiu a vaga. A assistente social orientou o aluno a entrar com um recurso e escrever uma redação explicando a situação.
Por enquanto, ele e cerca de trinta pessoas estão recebendo gratuidade na alimentação dos restaurantes universitários e residindo em um alojamento provisório no Centro de Práticas Esportivas da USP (CEPEUSP), debaixo de uma arquibancada. Isso só foi possível por conta de um movimento estudantil feito na primeira semana de aulas por esses estudantes que não foram contemplados pelo PAPFE.
Émerson acredita que caso seja contemplado com o auxílio futuramente, conseguirá ter um rendimento acadêmico melhor, já que não terá que se preocupar com questões relativas à moradia.
Sobre o auxílio, Suzana Gonçalves, aluna do curso de história na UNESP, afirma que os 800 reais são importantes, mas o valor deveria ser maior, levando em consideração os outros gastos que tem, como cursos de idiomas para ajudar na faculdade, livros para as disciplinas e lazer.
Outros desafios
No campus da UNESP de Franca, no interior paulista, Suzana relata a demora no deslocamento entre a moradia estudantil e a universidade, com um percurso de uma hora de ônibus, o que faz com que os moradores não consigam se alimentar sempre nos RUs.
Os entrevistados ressaltaram também que os horários de aula e as atividades extracurriculares impossibilitam os estudantes de trabalhar e que as bolsas oferecidas pelas universidades são insuficientes para manter os alunos. Suzana relata que um amigo pretendia trancar a matrícula para poder trabalhar, já que os 800 reais que recebe da Unesp são insuficientes para as necessidades próprias e da família.